quinta-feira, 26 de agosto de 2010

Por uma alma sem GPS

     Fiz ontem, uma pergunta ao querido Márcio Vassalo, que é jornalista e escritor.
     Ele me respondeu agora, e estou publicando aqui.
   
Ver resposta no site do Márcio

"Querido Márcio,
Acompanho suas respostas aqui, nunca perco nenhuma! Aprendi a viver lado a lado com o encantar-se, e esse espaço me ensina cada dia mais em como devemos lidar com as situações difíceis da vida sem perder o brilho. Eu queria que você falasse então de como lidar com o encantamento quando se está apaixonado? Parece bobo, mas o encanto pode ser coberto por tantas emoções fortes envolvidas: é um tanto de medo, de ciúmes, de insegurança... Li uma frase do Drummond que diz assim “O tempo não é medido pelo relógio, mas pelo vácuo na comunicação, pela expectativa sem segurança”. A expectativa sem segurança, acho que é isso que distrai o nosso encanto."

- Bruna Magno, jornalista - Curitiba – PR




Bruna querida,

A sua mensagem deu brilho no meu dia. Estou aqui com um bocado de e-mails para responder, um bocado de textos para terminar, um bocado de gente para telefonar, um bocado de coisas para fazer na rua, às vésperas do lançamento do meu livro e de uma viagem de semana toda para Belém do Pará, mas resolvi respirar para te responder. Ou será que te respondi para respirar? Assim, respirando com fundura, encontrei uma foto minha de quando eu tinha onze anos de idade, com o sorriso mais dentuço e mais oferecido de todos os sorrisos que eu já dei na vida. Bem, como faria o Mario Quintana, perguntei a esse garoto o que ele estava pensando de mim hoje. E então, enquanto o menino da foto pensava para me responder, decidi desacelerar um pouco, e te escrever agora, ouvindo La vie en Rose, música que eu cantava para ninar o Gabriel, meu filho, há uns dez anos, quando ele ainda não pesava nos meus braços.

Vou te dizer o que eu acho, como sempre faço aqui, nas minhas respostas, viu? Antes de tudo, é uma delícia saber que você está namorando O livro dos sentimentos. E nada do que sentimos é bobo, não, Bruna. Bobagem costuma ser o que nós fazemos com os nossos sentimentos e, mais do que isso, o que quase sempre deixamos que eles façam conosco. De fato, não temos como escolher os momentos em que aparecem os nossos medos, as nossas inseguranças, os nossos ciúmes, as nossas raivas, os nossos desassossegos, as nossas emoções mais indesejadas. Mas podemos escolher a hora em que vamos interromper tudo isso. A tarefa é difícil, sim, mas compensa a vida toda vez que dá certo.

Bruna, compensações à parte, será que uma expectativa sem segurança é realmente o que distrai nosso encantamento? Será que toda distração de encantamento é ruim? Tem vezes que nos distraímos do encantamento só para voltarmos ainda mais intensos e inteiros para ele. E também tem vezes que o encantamento é que se distrai de nós, de tantos ruídos que fazemos com os nossos pensamentos engarrafados num trânsito sem fim.

Quando falamos de sentimentos, incluindo aí a paixão, toda expectativa é um salto no trapézio, sem rede de segurança. Nesse caso, os sobressaltos, as taquicardias e os riscos são a danação e o encanto do que sentimos, do que nos tira o chão e nos dá asa ao mesmo tempo. Mas, para mim, na realidade, o que nos empurra para longe do encantamento, acima de tudo, são as nossas urgências mais sem importância, os nossos pensamentos mais barulhentos, as nossas ansiedades mais tiradoras de poesia, os nossos medos mais alimentados, a nossa vontade de controlar tudo o que nos acontece de mais belo, como se isso fosse possível. Será que existe controle para a beleza? Ou será que no fundo a beleza é o que mais nos descontrola? Numa época em que vivemos obcecados pelo êxito, pelo acerto, pelo sucesso e pelo controle, numa época em que grande parte do mundo tenta meter um GPS na alma da gente, perder o rumo e errar também pode nos fazer mais livres, plenos, mais autênticos, mais felizes. Outro dia autorizei uma amiga a errar. Gostei tanto que hoje me autorizei também. Que tal você errar um pouco hoje, Bruna? Errar também pode ser uma forma de se encantar. Afinal, não há nada mais incerto do que a beleza.

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