segunda-feira, 17 de agosto de 2020

Ressignificando nossas relações

Escrevo-te assim como quem escreve para alguém que nunca amou.

Não te amei, mas tentei.

E eis que, por fim, surge algum tipo de amor.

Não toda hora e nem de qualquer jeito. Mas, ainda assim: amor.

Amor por sua cor; por seu cheiro de terra.

Amor também pela forma como você brota do chão como um presente dos céus.

Ah! E suas vitaminas ímpares? Mais do que te amar, eu te respeito!

Acho bonita a forma como me mancha a mão. Haja água para te limpar de mim!

Quando me alimento de ti, todos sabem! Nunca passa despercebida: teu sumo deixa rastros violeta pela cozinha: nos puxadores dos armários; em gotas que se derramam pelo chão. Nenhuma outra igual a ti deixa marcas assim: és única! 



Quando eu era pequena, minha mãe me fazia um xarope caseiro de beterraba para curar uma anemia que eu tinha. Isso me traumatizou e me fez odiar beterraba a vida toda. Nos últimos anos, venho ressignificando minhas relações (com pessoas, coisas, lugares e circunstâncias). O resultado é libertador.

É fácil gostar do que sempre se gostou. É fácil odiar o que sempre se odiou. Difícil é aprender a aceitar nossos desafetos e dar um novo sentido para eles: prová-los de forma diferente, sob um novo paladar. Quando nos abrimos para isso, criamos um espaço para um novo sentimento. Quiçá outro tipo de amor. Ou nem amor e nem ódio. Um meio termo de sabor indefinido. Agridoce talvez.

*** Desenho da amada amiga Camila Ribovski

terça-feira, 21 de julho de 2020

Viajar no tempo é um mergulho no escuro, mas há luz

Dark é, basicamente, um seriado sobre viagens no tempo. Ali, as pessoas viajam para outros tempos, como quem viaja para outras cidades. Quem vai para o futuro não aceita que foi parar lá e tenta, incansavelmente, voltar para o presente, que, no caso, já é passado. Por sua vez, quem vai para o passado, se vê aflito sabendo que cada pequeno acontecimento, cada pequena escolha vai desenhar o futuro tal como já conhecem. Tem coisas que dá vontade de reescrever e tem outras que sabemos que precisavam acontecer.

De todo modo, não seria essa mesma a história de nossas vidas: uma repetição de não aceitação de tudo o que já não é? No presente não aceitamos o nosso passado e, se não tomamos muito muito cuidado, estamos fadados a - no futuro, não nos conformarmos com o rumo que as coisas tomaram.

Um dos personagens, preso lá no passado, quer voltar para o tempo que ele reconhece como sendo o seu tempo. Mas, ele descobre que não poderá fazer isso pelos próximos 32 anos. O que fazer? Continuar tentando voltar? Ou talvez aceitar que, agora, esse é o seu novo tempo e que a forma que ele decidir viver aqui e agora vai construir os outros presentes porvir, o futuro!

Se, no passado plantamos o que colhemos no presente e, aqui, no presente, plantamos o que virá no futuro, então é melhor começar a plantar boas sementes. Penso que, se não escolhermos com cuidado o que sentimos, pensamos e o que propagamos ao universo aqui, neste exato momento, pode ser que o futuro seja só mais do mesmo. O eterno retorno. Se não trabalhamos em nós mesmos no momento presente, não temos futuro e a vida se repete. E aí estaremos sempre presos no passado – estagnados!

Andei revisitando muitos afetos do meu passado, antigos amores que me feriram, amigos que já não caminham mais comigo. Não foi algo que busquei e nem foi motivado por algum tipo de nostalgia, só me aconteceu isso: o passado me voltando até que eu parasse para prestar atenção. O que foi que aprendi e o que de fato criei lá atrás que me segue até aqui? Sinto que, por muitos anos, as coisas eram dolorosas e desconexas, mas - quando decidi viver com mais responsabilidade, quando decidi delinear quem eu sou e para onde quero ir, o passado depois desse ponto é muito mais fluído, mais leve, menos denso, mais conectado e pelo qual posso dizer que as coisas não só me aconteceram desenfreadamente, mas eu disse sins e nãos conscientes - de acordo com quem sou e quero ser e, ufa! - agora sim sinto que minha história foi de fato escrita e narrada por mim.

Sei que no futuro não existirão mais as histórias de como as pessoas me feriram, de como eu reagia loucamente à forma como me tratavam, de como eu me mantive por períodos longos demais em relacionamentos que não eram para mim. A gente aprende, visitando o passado, que é importante saber quem somos para respeitar o que estipulamos: eu não admito ser tratada assim e, portanto, vou embora mesmo que algo em mim ainda queira ficar. Isso é um tremendo respeito para consigo mesma!

Também aprendemos que nem tudo o que nos é posto é para ser acatado e vivido, tem que saber muito de si mesma para dizer SIM para coisas, pessoas e situações que te levam na direção que você se propôs a seguir e mais ainda para dizer NÃO para o que claramente vai te levar para onde você não quer ir ou, melhor, pra onde você jamais quer voltar.

Espero que, cada vez mais, a gente viva com mais consciência e possa dizer com orgulho que não fomos moldados ao acaso, mas que nos construímos.


Ressignificando nossas relações

Escrevo-te assim como quem escreve para alguém que nunca amou. Não te amei, mas tentei. E eis que, por fim, surge algum tipo de amor. Não to...