sábado, 16 de outubro de 2010

Terremoto em escassez



Li esses tempos um poema do Mario Quintana que me fez suspirar, que me entendeu! Poemas são assim mesmo, gritam algo que há em nós! Gritam tão alto quanto os nossos sentimentos mais profundos, no mesmo tom, quase uma resposta para a alma. E a calmaria que um poema traz, vem da identificação que algo dentro da gente faz com os versos. Algo dentro da gente se sente em paz com a poesia que grita o mesmo grito, que fala a mesma língua.

CONFISSÃO
Que esta minha paz e este meu amado silêncio
Não iludam a ninguém
Não é a paz de uma cidade bombardeada e deserta
Nem tampouco a paz compulsória dos cemitérios
Acho-me relativamente feliz
Porque nada de exterior me acontece...
Mas,
Em mim, na minha alma,
Pressinto que vou ter um terremoto!

O que faz este poema me ecoar é essa coisa do terremoto na alma. Pois percebo que, apesar dessa coisa da paz interior ter virado clichê e estar na boca do povo, estar em paz parece anomalia! O que mais existe por aí é um povo com carência de um chacoalhão que estremeça a alma, ou ainda: gente que busca fora de si – e somente fora de si - por esses tremores.  E aí, até não ter programação de final de semana parece com a triste “paz de uma cidade bombardeada” ou de um cemitério. Por isso concordo tanto com a confissão de Mario Quintana. Oras, ter coisas exteriores acontecendo de nada vale se não vivemos aventuras interiores todos os dias. De nada vale se nossa vida interna não for agitada. De nada vale se não for um desespero, um susto, uma descoberta, uma sintonia. De que adianta esperar ser movimentado por um exterior, se não tivermos um verdadeiro terremoto dentro da alma? Um furioso tremor que não se contenta em viver de uma maneira morna, não se contenta com o mais ou menos, com a comodidade da falta de questionamentos próprios. E no final, os acontecimentos internos é que refletem lá fora. O exterior nada mais é que um reflexo do interior, e não o contrário!
Tenho me sentido tão down! Morna. Logo eu, que me irrito com pessoas que levam a vida de uma forma mais ou menos. (Sem querer abusar do Quintana, mas já abusando..) “Sinto-me assim, sem motivo algum, como alguém que estivesse comendo uma empada de camarão sem camarões, num velório sem defunto”. Foi isso o que senti: um vazio tremendo, uma vertigem, uma sensação de não pertencer a lugar algum. Me senti a própria empada de camarão sem camarões! Logo eu, que acho tediosas as pessoas que vivem reclamando de tédio. Diz lá no dicionário: “estado de desinteresse ou de falta de energia, como reação a estímulos percebidos como monótonos, repetitivos ou tediosos. Ocorre pela falta de coisas interessantes para se olhar, ouvir, perceber etc., ou para fazer (física ou intelectualmente), quando não se deseja estar sem fazer nada”.
Vivemos numa sociedade de informação, onde ficar entediado não tem mais espaço. Com a internet, temos diversas opções para nos livrar desse mal (amém!). Vídeos, blogs, jornais. É tanta coisa para se consumir todos os dias, que nem há tempo suficiente. Tanta informação de qualidade, que dá vontade de ter duas vidas! Quem não gosta de computador, tecnologia, ou sei lá – mesmo que seja para se informar e se entreter - tem por aí, bibliotecas, sebos, museus e etc. para todos os gostos e bolsos. Não tem desculpa mesmo! Só a arte já é uma forma de prazer sem fim, e ainda assim - por mais absurdo que isso pareça – uma grande massa não a usufrui.
Fora isso - da arte que hoje é de tão fácil acesso, e nos ocupa o tempo causando satisfação - temos nossa imaginação e o nosso sonhar acordado. Por isso, se sentir entediado, se sentir mais ou menos e morno, com nada que nos alegre, vez ou outra pode ser normal, e até faz bem para dar contraste na vida - já que até uma vida mil por cento todo dia só é reconhecida por ter dias com a porcentagem zerada. Mas se o tédio é um sintoma presente com freqüência é sinal que a relação consigo mesmo não tem sido das melhores.
Foi do que me dei conta está semana. Nem a internet, a arte, e minha imaginação me livraram de um baita aborrecimento – que é sinônimo do tédio. Fiquei inquieta, e cheguei a essa conclusão: “só posso ter perdido a conexão comigo mesma”.
Hoje, quase tudo voltou ao normal. Tive uns dias estranhos e opacos, normal e humana que sou. Mas e quem tem uma vida repleta de dias mais ou menos, de dias vazios? Acho que tédio nada mais é do que uma seqüência de dias mornos, dias à espera de fatos externos, dias à procura de uma felicidade e de emoções que emanem do outro, que venham de fora, quando na verdade, estão dentro da gente.
Nossa alma é um paraíso pouco explorado, um paraíso descartado, pouco observado. Nossas maiores aventuras vêm de dentro, do que faz nosso coração borbulhar, do que faz pensarmos em tudo o que queremos fazer, do que faz ter sede de vida, e nos dá vontade de sair gritando e pulando, vontade de conquistar o mundo. Essa incessante e desesperadora procura, e a sede de descoberta e novidades que temos é devida! O erro está no lugar onde essa busca ocorre, porque – mais uma vez - é dentro, e não fora que precisamos tratar. Quem não trata dentro, pode escalar o Everest, visitar o Machu Picchu ou vivenciar qualquer incrível aventura e, ainda assim, nada descobrir, nada compreender, nada sentir.

2 comentários:

Anônimo disse...

Como sempre minha filhota ,sua nota é dez...adorei.

Gil disse...

O tempo enorme caleidoscópio, e dentre as responsabilidades que adquirimos em troca do ingresso; saber girar esse treco.

Porque ás vezes não é fácil, tá emperrado, ás vezes é na força, no jeito, na fé prá que o mardito passe prá próxima imagem e estejamos deslumbrados, de novo.

Um pouco mais.
Por um pouco mais.
Um tanto adiante.
sei lá =P
Gosto de como teus textos vão longe, Bruna.
Beijo.

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